segunda-feira, 7 de junho de 2010

Mentira

As coisas são tão simples
quando se olha de perto.
Nada é mentira
se eu sinto de verdade.
Mesmo que passe como um trovão
e faça estrago com um terremoto
e dure menos que uma gozada.
É verdade quando não se pensa.
É verdade
quando não se olha.
Quando se faz por fazer
e só isso
o fazer por não ter outra escolha
por ser a unica alternativa
por ter se entregado
nunca é mentira.
Então não diga que eu me engano
que tenho medo dos meus sentimentos
porque eu me atiro neles
mesmo mergulhando numa piscina de merda.
Eu me atiro para o que der
e vier.
Eu vôo, às vezes também,
mas isso nunca
foi escolha minha.

quinta-feira, 13 de maio de 2010

Momento feliz 4

Um pena voa solene
pelo quintal. Faz círculos,
desenhos invisíveis
sobe
desce
vem bem pertinho de mim
e então
voa embora.
Uma brisa balança
as flores.
Pássaros cantam
baixinho.
O rádio toca um samba
triste.
E tem esse cinzeiro azul
na minha frente
quase
transbordando.

Acendo um cigarro
Olho para os lados
e não vejo nenhuma mulher.
Não me seguro
e começo a rir.
Dou uma tragada
sopro a fumaça longe.
Ainda tenho alguma coisa para
beber.

É, em breve elas voltam,
em breve. Enquanto isso
eu aproveito o quintal.
Sorrindo
e me preparando para
elas
para a próxima
facada.

Fico em silêncio
-sorrio, fumo, bebo, escuto-
e aquele cinzeiro
parado
na minha frente
sorri
um pouco também.
Vejo um pássaro
parado no fio elétrico
falta uma pena nele.
Um pássaro comum
perdendo um pouco de si
para agradar quem fuma
e bebe sentado
na varanda.
Igual a qualquer um de nós.

terça-feira, 27 de abril de 2010

A boca

Outra vez
outra janela.
Eu fumo
olhando as árvores
balançarem com
o vento gelado.
Sinto frio,
um frio bom
quase
um abraço.
Olho para trás
e vejo um espelho
e nele
uma massa de carne
feia
cheia de coisas
que já passaram.
Eu pego meu cigarro
e assopro
a brasa.
E de lá
estrelas cadentes pulam para o céu.
E a Lua sorri
um pouco.
E eu sorrio para ela.
E minha vida vai
em chamas
voando por entre
as árvores.
Então
eu não consigo parar de rir
pensando em tudo aquilo
nas estrelas cadentes
no espelho
na massa feia de carne
na minha vida
nas árvores
e naquela janela
que é uma
janela
nova.

A porta se abre
e por ela
entra uma boca
uma boca enorme
que sorri
e me mata um pouco
que sorri
e me tem
que sorri
e me faz esquecer
aquele espelho e
aquela janela.

Toco o cigarro fora
e ele cria asas
e voa para o céu
explode como
fogos de artifício
como ano novo
como novidade.
E aquela boca
continua sorrindo
e a gente fica
olhando aqueles fogos
no céu.
E a gente sorri
e gargalha.
Então
a gente deita
e ela me engole
e eu durmo
confortável
dentro dela.
E aquela massa feia
não é tão
feia
assim.

terça-feira, 13 de abril de 2010

Vestido verde

Um vestido verde
caminha pela rua
e ele pára
o tempo e a vida
cria e acaba
guerras
colisões de trânsito
ereções
ejaculações
leva homens
a sanatórios
ao alcoolismo
levanta pontes
prédios
todos os caminhos
que levam de volta
a ele.
Um vestido
verde
tem mais poder que
qualquer presidente
que qualquer país
um vestido
verde
é o fim
e, normalmente,
é o começo.
Muita coisa depende de
um vestido
verde
a vida
a morte
o ar
eu
você
eles
nós
e até essas palavras
só existem
pelo
vestido
verde
que corre em mim.

segunda-feira, 29 de março de 2010

Dança

Eu parei
perto dela.
E ela não olhava para mim
e eu não conseguia olhar
para outra pessoa.
E eu dançava.
Patético, eu
dançava.
Eu que
nunca dancei.
E abanava meu rabo
como um cachorro no
cio
numa tentativa
desesperada
de parecer
normal.
Sem muito
sucesso, é
claro.

Tem um cigarro?,
ela perguntou.
Puxei um maço
do bolso da camisa, tirei
um
botei na sua boca
e acendi.
Logo depois
fiz o mesmo para mim.
A gente devia dançar,
ela sugeriu puxando meu
braço.
Eu tentei, tentei observar as
outras pessoas
repetir os movimentos,
esquecer toda aquela cerveja
e toda aquela vodka
que me fazia virar sempre
mais do que devia
e quase cair por cima
dela.
Ela ria a cada passo.
Não sei dançar, mas eu amo
como ninguém,
gritei no seu ouvido.

Ela parou,
olhou para mim,
e sorriu.
Ela sabia que eu era
maluco.
Só não tinha percebido
até aquele momento.
Pediu licença e foi
ao banheiro.

Pedi uma cerveja
esperando ela
não voltar.
E eu nunca mais
danço outra
vez.

segunda-feira, 15 de março de 2010

Era um carro, era uma despedida, era tudo outra vez.

Ela estava parada
na minha frente
esperando um abraço
esperando para ir embora.
E ela me olhava
de cima a baixo
e tinha amor naqueles olhos.
Era um espécie de admiração
e desejo.
Um olhar que só
queria meu bem
queria me confortar
me amar
me envolver.
Os olhos diziam para eu mergulhar
ali
para eu entrar e nunca mais sair.
Ela sorria com
vergonha
e os olhos não tinham constrangimento
algum
em me convidar
para dançar.
Ela me abraçou e eu
abracei ela
forte e mais forte.
E senti o cheiro
do seu pescoço
o único cheiro que
havia no mundo.
E enquanto nos afastávamos
Aqueles olhos
olharam os meus
e viram
exatamente
a mesma coisa
que saía dos
olhos
dela.

terça-feira, 9 de março de 2010

Sandra 2

Sandra
finalmente
desistiu.
Não queria beleza.
Se dedicou ao amor.
Se dedicou ao pau duro.
Se dedicou a não procurar.
Então, Sandra me achou.

Sandra tinha um vestido verde
e unhas vermelhas e sapatos
brancos.
Eu tinha todo o amor do mundo
nas costas.
E, sem beber muito,
um pau duro.

A gente sentou
e a gente bebeu.
E a perna dela foi passando pela
minha
e ela tocou
aqueles peitos
que vinham do céu no
meu braço.
E ela me olhou
e eu morri um pouco
e ela sorriu
e eu nunca me senti tão
vivo.

Sandra falava qualquer
coisa
como se fosse importante.
Falava de amor, com paixão
como uma mulher que
nunca foi amada.
Sandra não escondia sua
beleza
mas não mostrava
não era preciso.
Ela tinha um jeito de deixar
você saber
que estava tudo
ali
somente com uma palavra
com um sorriso.

A gente continuou bebendo
e ela pedia uísque
enquanto eu
ia na vodka.
E a gente
intercalava
com algumas cervejas.

E a perna dela
ia
tocando na minha
e os peitos já conheciam o meu
braço.
E na metade de um gole
ela me beijou
tirando o copo da minha boca.
E ninguém se importava com beleza.
E ninguém se importava com nada.
E a gente caminhou
juntos para a casa dela.
Era madrugada. E não tinha
perigo ou problema algum
que um beijo não
resolvesse.

A gente subiu as escadas.
E quando entramos no quarto
poucas roupas restavam
para se tirar.
E a bebida não foi um problema.
Sandra achou um pau duro.
E quando a gente pegava
no sono
olhando aquela luz que vinha
dos olhos dela
e não me deixava dormir
eu me apaixonei. E assim
Sandra achou o amor.

E a gente
dormiu
assim
esperando
a decepção
vir
e estragar tudo
o que parecia que
era para ser.

segunda-feira, 8 de março de 2010

Sandra

Seu nome
era
Sandra
e as pernas
de Sandra
paravam qualquer bar
em qualquer lugar.
Ela tinha olhos
como todo mundo tem
mas os olhos de Sandra
tinham mais luz
que qualquer outro.
Seu nome era Sandra
e ela tinha peitos redondos
que apontavam para o céu
como uma prece
como um foguete
como o que merece ser louvado.
Seu nome era Sandra
e ela falava de amor e pau duro
e ela queria amor
e
pau duro.

Sandra bebia uísque
e cerveja
e fumava Lucky Strike.
Seu nome era Sandra
e Sandra queria Pedro.
E Pedro tinha olhos azuis
e um corpo malhado.
Pedro queria Sandra.
Todos nós queríamos.
E enquanto
Sandra amava
ele comia.
Enquanto Sandra
beijava
ele queria.
Enquanto Sandra
abraçava
ele sorria.

Sandra sabia o que era amor
pelo menos
ela achava que sim.
Sandra queria se apaixonar e
ser amada
ser Sandra não bastava
era diferente
qualquer mulher queria ser
Sandra
mas
para Sandra
isso era pouco.
Pedro queria sexo
só sexo
não sabia o que era amor
os olhos de Sandra não significavam
nada.
Sandra era peito e bunda
e aquela boceta.

É difícil a vida das pessoas bonitas
presas no instinto de reprodução
ideal
sem amor ou verdade
mas o sexo
ah, o sexo parece ser bom.

segunda-feira, 1 de março de 2010

Trabalho

Aqui, sentado
na frente de um computador
esperando
esperando trabalho
a hora de ir
a hora de chegar
esperando meu quarto
tudo parece tão estúpido.
Tudo é tão
estúpido.
Então
eu olho para as árvores
pela janela
e elas são tão verdes
iluminadas pela luz
amarela
do Sol.
Não vejo saída disso
tudo.
Me vejo caindo
do cavalo
da vida
me vejo morto
sozinho
me vejo sem ilusão.
E tem um vento
que sopra pela janela
e deixa meu rosto gelado
e seca meus olhos.
Só me resta
levantar o queixo e
deixar o vento
me envolver.
E tudo, assim
de repente
parece mais calmo
parece diferente do que
devia ser
parece bom
parece mentira.
É mentira.
Eu só
quero liberdade
suicídio e
um pouco de amor.
Eu quero a solidão.
Eu quero um abraço.
São 17:30
Falta meia hora
e eu saio daqui. Vou me trancar no meu quarto
ler um pouco, fumar
talvez até chorar;
é, hoje eu merecia chorar.
Tem essa tristeza que está a minha
volta
essa coisa estúpida
essa coisa que é a vida
a merda toda.
Hoje eu merecia chorar
e só de ver essa luz
amarela
naquele verde
glorioso que
vem das árvores
eu sei que eu merecia chorar.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Momento feliz 3

O sutiã abrindo
com uma mão
fácil,
um botão
que se solta
como quem quer
se abrir.
Um suspiro
um gemido.
E um pau duro
que é
nada mais
que a comprovação
de que tudo
é
exatamente
o que devia ser.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Sobre carnaval e postes-de-luz

Era carnaval e era Santa
Catarina.
Era uma festa e era um lugar
de gente
bonita
de gente
com dinheiro
de gente
que precisa de carnaval.
Eu caminhava por entre
as pessoas
e não via muita vida nos olhos
delas
e elas eram hostis,
sempre quem tem tudo é
hostil com quem não tem
nada.
As mulheres eram lindas
e arrumadas
e ninguém ficava bêbado de verdade
eles só eram um pouco mais
felizes.
As mulheres não tinham nada
o que eu quisesse
talvez o corpo
eu entraria nelas
eu comeria elas
mas eu não me apaixonaria
por nenhuma;
não valia a pena tentar.
Eram postes-de-luz
que erguiam o nariz e faziam
cara feia
para todo mundo.
Por que um poste-de-luz
levantaria o nariz?
Por que um poste-de-luz
se acharia melhor
que um poste qualquer?

Bem, era carnaval
e eu não queria estar ali,
um sangue ácido corria
por mim
e me fazia sentir bem
e rir e gargalhar.
Eu queria gritar.
Era carnaval
e o carnaval é para as pessoas
que precisam do carnaval.
Ali nasce um amor
que morre com a luz do dia.
Os postes-de-luz precisam disso.
Eles precisam do carnaval
para se libertarem.
É uma desculpa.
Nós não
nós não precisamos
de carnaval
nós somos
ele.

E eu ri pensando
nisso,
meu Deus, eu ri
ajoelhado no chão.
Dançando e pulando na areia.
Cantando.
Pedindo samba,
amor e que eu sumisse
dali.
Era carnaval, e se não fosse
seria qualquer dia
com amor e sexo
como qualquer carnaval.

E para que os postes-de-luz
vivam mais um ano,
eles precisam saber que em fevereiro
tem carnaval
e que eles podem ser e sentir como
eu sou e sinto o ano todo.
Eles podem ser livres deles
mesmos.
Livres da sociedade.
Tem carnaval, postes-de-luz,
todo dia, eu mostro onde
eu mostro como,
mas, por favor,
abaixem essa porra
de nariz
em primeiro lugar.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Momento feliz 2

Dizer sim e não
ou não dizer nada
sorrir
gritar, gozar
amar
pensar na vida
com uma brincadeira
como amarelinha
sem rodar como o pião
ser sem sentido.
Não precisar fazer sentido.