domingo, 25 de julho de 2010

O meu dia de Jesus Cristo

Eu descia a rua
passando as marchas
com paciência
e soprando lindos anéis
de fumaça.
Queria ir até
onde a vida me deixasse
levantando copos e urrando
obscenides
sem sentido
para a Lua.
Minha cabeça balançava ao
som do rádio
e meus olhos
úmidos
de prazer
refletiam faróis
e amores que passavam.
Então
eu o vi.
Duas quadras a frente
empurrando sua moto.
Alguém que
perdia a sorte
e buscava alguma coisa.
Vou ajudar esse infeliz,
pensei.
Pensei também
nas estatísticas
e como eu tinha chances
de ser morto
ou pior
estuprado.
Eu sou uma pessoa
boa
queria fazer alguma coisa
oferecer carona
e mesmo não entendendo nada de
motos ou motores
eu podia tentar ajudar.
E, caso levasse um tiro
ou uma facada,
Deus saberia que eu morri
sendo bom.
Talvez o melhor!
Passaria direto para o Céu
escapando
da burocracia do purgatório
e do enorme pau
violador de Satanás.
Seria um anjo voando
e espiando mulheres tomando banho.
Diminui a velocidade
e quando passei ao seu lado
ele virou para mim.
E quando nossos olhos
se cruzaram
lembrei-me
que não acredito nessa
merda
de
Céu ou
Inferno.
Passei a marcha e acelerei
em direção do
meu paraíso
que vestia, por sinal,
um vestido verde.
E ele ficou lá
carregando sua moto
e eu carregando minha vida
e continuamos
iguais
abandonados
como o resto do mundo.

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Como um dia qualquer

Era um dia que não dizia
nada
quinta-feira
e só.
Eu conversava, bebia
e sentia saudade.
Então, ela passou por mim.
Ela que já tinha passado
antes
e tinha ido embora.
E a saudade
não era dela.
A saudade era minha
e de mais ninguém.
E enquanto ela passava
a mão
pelo meu rosto
a saudade
ficou com ela.

Ela me puxou pela
mão
e levou-me para sua
casa.
E a saudade
tinha ido embora.
Guardada em algum
lugar.

Eu estava deitado
saciado e ofegante
enquanto ela esfregava
o rosto em meu braço.
Puxou-me para
perto dela
e pediu para que eu contasse
uma história para ela conseguisse
dormir.
Eu ri
e ela riu também.
E todo esse amor guardado
que eu tinha dentro de mim
tinha que ir para alguém.
Então
apesar de tudo, comecei,
ela era uma menina ruiva, eu disse,
e achou um cavalheiro barbudo
na beira de um rio
e quando ela pediu fogo
ele se entregou...
E fui contando essa
história
nossa história, que não era nada.
E ela se excitava e agarrou-me
pelo pau
e puxou-me para dentro dela.
Ela gemia e mordia meu ombro.
Gritava e eu gritava junto
em silêncio.
E quando eu cheguei ao fim da história
ela gozou
e gozei também.

E nada fazia
mais
muito sentido.

segunda-feira, 19 de julho de 2010

A música da noite é o som dos deuses

É madrugada.
Corre um vento gelado pela
cidade.
Estou parado na sacada
e sopro uma fumaça azul
e verde.
Algo dentro de mim
é feliz.
É, não sei se feliz
mas não tem nada
ruim aqui. Estranho.
Eu rio com os
deuses
que brindam
com a cerveja que corre pelo céu.
Escuto de longe alguma
música.
É jazz.
Meu Deus, é um
jazz maravilhoso.
Escuto o trompete
chorando e jorrando
sangue e suor.
O sax traz tudo
de bom que o mundo tem.
Enquanto os deuses tocam com
seus
trovões e cães latindo.
Eu assobio
e a fumaça
que sai da minha boca
dança como
bailarinas russas.
Imagino de onde
vem esse som.
Fecho os olhos.
E a algumas quadras
à direita
vejo uma mulher sentada.
Ela veste um
vestido
verde.
E lágrimas
vermelhas
escorrem pelas
suas bochechas.
Ela andou bebendo
e tem o coração partido.
A chuva continua caindo
e é um lindo solo de guitarra
batendo nos telhados de
brasilit.
Os deuses urram por
barulho.
E os pássaros noturnos
gritam em desespero.
Aquele vestido verde
está comigo
na sacada
agora
e ela não chora mais.
Ela sorri e abre os braços.
Os carros passam como arcordes
de violino
eles giram e se voltam para nós.
Um orquestra que se
forma nessa noite.
Um orquestra reservada
para quem
consegue escutar.
A gente dança um pouco.
E do seu pescoço
eu cheiro um
mar de flores desconhecidas
que são tão coloridas.
Eu mergulho como se fossem
uma piscina perfumada
e assim
nós nadamos juntos
sem precisar de roupas ou
qualquer pudor.
A minha sacada
é um lugar mágico,
eu penso.
Enquanto aquele vestido
se prepara para dormir.
Eu escuto o som
de um baixo melancólico
que se forma das gotas
que caem na piscina.
Tudo ganha calma de novo.
Os deuses acalmaram-se
querem um grito silencioso.
Querem o sabor da noite
que tem gosto de caramelo.
Eu sopro meu último suspiro
de fumaça verde
e grito para o céu.
Um vento gira ao redor
de mim
e me levanta até as nuvens
onde eu deito e espero
a sinfonia
da próxima noite.


segunda-feira, 12 de julho de 2010

Adeus, medo do espelho

Entrei no elevador.
Um espelho
olhou para
dentro de mim
então
abaixei os olhos
e dei as costas para ele.
Algumas pessoas me olhavam.
Sentia alguém me chamar
alguém que
não me tocava
mas podia sentir
uma mão puxando meu
rosto
para o espelho.
Não resisti
e encarei meu reflexo.
Um enjôo tomou
conta de mim.
Algo chutava minha
barriga de dentro
para fora.
A dor ficava mais
e mais forte.
Senti a pele cedendo.
E foi rasgando
desde minha garganta
até minha cintura.
E uma perna saiu de lá.

As pessoas gritavam
e alguém apertou o botão
de emergência.
Uma senhora ajoelhou-se
aos meu pés e chorava.
A mãe cobria os olhos
do filho,
enquanto um senhor de
terno olhava
para mim
em reprovação.

Depois outra perna saiu
de dentro do corte
e logo havia um
homem parado a minha
frente.
Lembrava-me dele
tentou me matar
algumas vezes.
Nós éramos iguais.
Mesmo olhos, boca
nariz, tamanho
tudo.
Era eu.
Nós nos encarávamos,
não gostávamos um do outro.
Mas ele sorriu
e tirou um pássaro
morto de dentro do bolso
e balançava aqui
perto do meu rosto.
"A vida é ver o pássaro morrer
em nossas mãos
sem poder fazer nada
e sorrir quando ele nasce de novo",
disse.
Segurou minha mão
e deixou o pássaro
comigo.
Agarrou meu rosto
e disse que me perdoava.
Passou os braços por
mim e me abraçou
cada vez
mais forte
e senti suas lágrimas correrem
pelo meu ombro.
Minha camiseta ficou
encharcada e não
segurei as lágrimas
dentro de mim.

Escutava as pessoas chorando e
gritando de horror.

Senti algo se mover na minha
mão
e quando abri os dedos
o pássaro voou sobre nós
e nós nos olhamos
novamente
e choramos juntos
pelo perdão
nosso perdão.
Nos abraçamos e
eu era um só
quando ele foi embora.
Encarava o espelho
e sorria.
Sem enjôo
sem ressentimento.

E enquanto o segurança
me arrastava para fora
do prédio
eu sorria com o peito
e braços
abertos.

domingo, 11 de julho de 2010

A fuga é uma panela de pressão pronta para explodir.

Eu já senti falta
antes.
Eu já amei.
Eu já vi uma boca
ir embora
e esperei pela próxima.
E a próxima
fazia tanto sentido.
Eu esperava
ela.
Eu passei
tempo
fazendo essa boca
ir embora.
Nada novo
nada velho.
Eu queria fugir
da dor
de não poder ser o que
a boca
queria.
Mas eu fui
preso.
Me sento nessa jaula
e espero alguma
notícia.
Eu vou em frente.
Experimentando
bocas novas
bocas boas.
Bocas que
não são nada.
Me sinto tão vazio.
Fisicamente.
Eu respiro fundo
e não há nada
aqui dentro.
Há um vazio
que ela deixou.
Que logo será preenchido.
Que logo não será
dela.
Que logo
vai me fazer esquecer
o que fez
tudo valer a pena.
Eu tentei chorar.
Juro.
Achei que as lágrimas
me fariam bem.
Achei que lavaria ela
embora
de mim.
Mas as lágrimas
nunca
vieram.
Assim
como ela nunca
foi.
Eu sinto saudade.
Meu Deus,
eu sinto tanta saudade.
Sinto saudade
do que não quis.
Sinto saudade daquela
boca que
tentei fugir
e que não vejo maneira
de fugir de mim.

Sim, logo eu acho outra boca.
Logo eu esqueço.
Mas continuo
caminhando
de tanto medo
do dia
que não irei
conseguir lembrar.

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Os dias passam como uma flor que morre.

Eu lembro daquelas noites
quando eu dormia
depois.
E lembro de como
sempre tinha um chocolate
para nós.
E do jeito que ela gozava
e dizia que adorava
me ver gozar.
E lembro daqueles olhos
fechados
e de como ela sorria
sem acordar
com um sussurro no
ouvido:
"linda".
E o jeito que
ela mexia os pés
junto aos meus.
E se ajeitava
esperando um abraço.

Agora
eu penso nisso tudo
e
dói.
Dói uma dor
boa.
Algo que me faz sorrir.
Enquanto eu deito
na minha cama
sozinho
e como um chocolate
porque foi tudo
que ela deixou.

terça-feira, 6 de julho de 2010

O corte.

Hoje eu acordei
meio tonto
sentindo um liquido
que grudava o lençol
em mim.
O líquido era vermelho
sangue
e a tontura
era só alguma coisa
que não estava ali.
Empurrei os cobertores
e lençóis para o chão.
Vi uma linha
que corria
desde a minha
terceira costela esquerda
até a quarta
do outro lado.
Passei o dedo
por ela
bem devagar
com medo
e a linha foi abrindo
aos pouco
num corte fundo.
Separei com os dedos o resto de carne que
ainda
deixava o corte fechado
e
olhei lá para dentro.
Não havia nada.
Nada de sangue
órgãos,
nada.

Estiquei a pele
e enfiei minha cabeça ali.
Havia muita água
e alguns peixes subiram
à superfície e olharam
para mim.
No canto do lago
um gato
se lambia e as
às arvores não tinham sentido
nem porque estarem lá.
Uma criança estava sentada
à sombra de uma
das árvores.
Ela esmagava algumas formigas
com o dedo e
brincava com as que
caminhavam pelo seu braço
E alguém queria matar essa
criança.
Alguém escondido no bosque
por de trás
das galinhas brancas
que se iluminavam
com o sol mais vermelho
que qualquer manhã
poderia querer.

O lago foi mudando
de cor e textura,
a água
se transformando em sangue e vinho.
Os peixes
curiosos
agora
tinham os olhos
vidrados nos meus
e deixaram mostrar
seus dentes.
Piranhas.
Sempre há alguma.
A criança guardava
uma faca
cravada no peito.
E começou a chorar quando me viu.
Então,
tudo foi
ficando escuro
e tudo foi sumindo
aos poucos
até desaparecer numa
mancha negra
que
tomou conta de tudo.

Agora
eu sentia cheiro de bebida;
vodka, talvez.
Escutava tambores e muitas
pessoas rindo.
Meu rosto iluminou-se
no meio da multidão.
Eu tentava gritar
mas não me escutava.
Eu não sorria.
Sentia minha solidão
no meio daquela gente toda.
Sentia que alguma coisa faltava.
Eu bebia. E bebia mais.
Não parava de fumar.
E nunca me vi sorrindo.
Passavam
algumas mulheres
por mim.
E ela nunca passou de
novo.

Quando tudo ficou claro
me vi deitado em minha cama.
Escutava meus pensamentos.
Meus arrependimentos.
A saudade.
Maldita saudade.

Agora eu estava na Europa
e me via rindo
caminhando sem sentido
ou sem vontade.
Por casas tão bonitas
e sem dinheiro para
me apegar a qualquer coisa.
Vi a italiana que guardava
meu coração numa bolsa
pequena
e a carregava grudada ao peito
escondida pela blusa.
Era mais uma noite quente
como esta
mas eu caminhava tranqüilo
pois eu nunca tinha
passado
nenhuma noite quente
com ela.
E ela
não fazia falta.
Molhava meu pé
na água morna
de num mar
sem ondas
e sorria.
Sorria porque
eu podia
porque não tinha nada
mais em mim.
Sorria ao vazio.

E quando eu entendi isso
tirei minha cabeça de
dentro de mim.
Virei para o lado
e voltei a dormir.

sábado, 3 de julho de 2010

Sonhos

Hoje eu sonhei
que estava acordado.
E não tinha dor nenhuma
perto de mim.
Hoje eu sonhei que
estava morto.
E não tinha
dor nenhuma
em ninguém.
Sonhei que me contorcia
na cama
e meus olhos viravam
cuspia sangue
e alguém ria.
Hoje eu sonhei
que tudo voltou a ser como era.
Que a vida
inteira
era um
cachorro se coçando
sob o sol.
Que o amor
fazia algum
sentido.
Que a felicidade
era de verdade.
Hoje
eu
sonhei.

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Àquela.

As lágrimas não querem cair.
O peito ainda
dói. Um dor
boba.
Uma dor que
pede um abraço
e nada mais.
Eu sinto saudade
daquela
boca.
Daqueles seios.
Eu sinto saudade
dela.

Eu sei, eu disse
que não iria mais sentir
saudade.
Que isso era um sentimento idiota.
Que o amor era para ser
entregue
e não guardado.
Mas aquela boca
me engoliu
um dia.
Eu não sei como
não vi nada
não senti.
Foi aos poucos.
Me engoliu num sorriso.
Me engoliu falando
"quero você".

Agora, eu sinto isso
isso que chamam saudade e
mesmo estando dentro
daquela boca
eu grito
a ela:
Saudade.