domingo, 1 de agosto de 2010

O dia em que o teto desabou

Era um sábado chuvoso
eu dirigia
com uma nuvem verde
correndo pelo carro.
Observava
com os olhos brilhando
a chuva dançando no asfalto.
Trocava as marchas
rápido
e dirigia devagar
procurando
sem muita ideia
alguma coisa para fazer.

Vi um shoping a
algumas quadras.
Pensei que seria legal
tomar um café
e observar as pessoas
fazendo biografias imaginárias.

Era liquidação
até 50%
e talvez eu tenha
cometido um erro,
pensei.
Casais passeavam.
Os homens carregavam sacolas
e usavam blusões pendurados
como macacos carentes
no pescoço.
As mulheres eram bonitas
algumas até lindas
e não tinham brilho
algum.
Eles não estavam juntos
ou vivos
de verdade.
Eles estavam lá
porque achavam que deveriam
porque era aquilo que ensinaram que
deveriam
fazer.
Não se tocavam
mãos e pés e corações
separados por alguns
passos.
E eles corriam a minha volta
pulavam e gritavam e
riam como abutres
e diziam que ali
estava o meu futuro.
Tentava fazer eles calarem a
boca.
Era inútil.
Eu seguia caminhando
com os casais de mortos
me seguindo
e agora
sussurravam que eu era
um deles.
Decidi que um café
não era para mim
no momento.
Decidi que eu precisava de
uma cerveja.

Fui caminhando até a praça
de alimentação.
E quando eu cheguei lá
Todas aquelas pessoas
e todos aqueles
milhares de olhos
me encaravam.
Começaram a bater
copos, talheres, pratos, cabeças
na mesa
e como uma torcida
de futebol
cantavam:
você é um de nós!

Eu estava apavorado
pronto para sair correndo
para ir embora daquele lugar
mas eu sabia
agora
eu precisava de uma cerveja.

Fui caminhando
pé após o outro
analisando
cada passo.
Fui devagar
acompanhado por
todos aqueles olhos.
Cheguei ao restaurante
e pedi um chope
grande.
A mulher
que trabalhava no caixa
tinha os olhos iguais a um
umbigo
pintados de branco
e me informou
que só acharia
naquele lugar
chope pequeno;
300ml.
Eu sabia que aquilo não
seria
o suficiente.
Eu sabia que precisava de mais.
E sabia
também
que eu não gostaria de voltar ali
para pedir outro.
E quando contei a caixa
que precisava mais tempo
para pensar o teto
desabou.

Eu olhei para cima
e vi um monte
de pêlos brancos
pendendo do céu.
E quando eu entendi
que aquilo era uma barba.
Me ajoelhei no chão
fechei os olhos
e agradeci.
Agradeci
pelas mulheres que são
de vestido verde.
Agradeci que eu não era parte
daquilo
e sabia disso.

E quando eu abri
os olhos
de novo
tudo estava normal.
O teto estava inteiro
ninguém cantava
ou batia a cabeça na mesa
ninguém olhava para mim.
Exceto a mulher do caixa
com seus olhos pintados
esperando uma resposta.

Bem, acho que eu vou querer
dois pequenos,
respondi.
Ela tentou sorrir
sem sucesso
e disse para eu esperar a minha
mesa.

Alguns minutos depois
eu tomava meus dois chopes
intercalando os copos
em goles pequenos
sorrindo e observando a caixa que
me atendeu
bater
a cabeça na parede.

Nenhum comentário: